quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Alagoanos apresentam pesquisas e projetos no 16º Encontro de Astronomia do Nordeste

No evento, diretor do observatório astronômico de Maceió palestrou sobre a importância dessas publicações para o desenvolvimento da ciência

Por Pedro Barros

“Olha pr’o céu meu amor, veja como ele está lindo...”. Luiz Gonzaga não precisa nem pedir: para os nordestinos que se reuniram este fim de semana, de 26 a 28 de maio, no Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), observar a rotina celeste faz parte do seu cotidiano. Cearenses, potiguares, paraibanos, pernambucanos, alagoanos e sergipanos participaram do 16º Encontro de Astronomia do Nordeste (Eane 2016), que contou com 8 palestras e 15 apresentações orais, além da exposição de pôsteres científicos, de astrônomos profissionais e amadores.

Delegação alagoana incluiu membros do Clam e Ceaal e representantes do Cecite

A astronomia revelou sua multidisciplinaridade na diversidade das palestras. Marcelo Zurita, da Associação Paraibana de Astronomia (APA), por exemplo, explanou sobre o Encontro Paraibano de Astrofotografia (EPA), o maior do Nordeste; já o químico João Bosco Paraíso mostrou a pesquisa que tem realizado na UFPE que pode ajudar a entender a formação de determinadas substâncias orgânicas no espaço; Sílvio Garnés, do Departamento de Engenharia Cartográfica da UFPE, foi o convidado para falar das coordenadas do céu, campo de estudo compreendido pela astrometria.

Os nordestinos também receberam uma visita do Sul do país: Rio Grande do Norte pôde se encontrar com Rio Grande do Sul graças à presença de Cristian Westphal, criador do site Ciência e Astronomia. O jovem de 20 anos, que coordena um dos maiores canais de divulgação científica brasileiros no YouTube – com mais de 76 mil inscritos –, mediou, por videoconferência, uma das palestras mais aguardadas do evento: o físico Paulo Leme, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG/USP), explicou as etapas da missão que conseguiu, pela primeira vez, pousar a sonda Philae no cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko. “Existem três categorias de missões espaciais: as difíceis (voo rasante), as muito difíceis (entrar em órbita) e as ridiculamente difíceis (aterrissar em um planeta). Aterrissar em um comenta é uma missão ‘quase impossível’”, brincou o cientista.

Diversidade de temas
Os trabalhos submetidos seguiram no mesmo caminho: as apresentações foram de educadores compartilhando suas experiências no ensino de astronomia até astrônomos amadores mostrando os instrumentos que montaram para estudos astronômicos. “Cultivando com as estrelas” foi o título do trabalho de Jhonatan Carvalho de Souza, da Paraíba, que buscou relacionar o conhecimento tradicional de agricultores com os conhecimentos científicos da astronomia.

O monitoramento da passagem de meteoros pelo céu nordestino foi um dos assuntos mais falados, principalmente pela presença dos membros do Brazilian Meteor Observation Network (Rede Brasileira de Observação de Meteoros), a Bramon. São verdadeiros caçadores das “pedras do espaço”, que perseguem os rastros deixados por elas, no céu ou na terra. Uma equipe seguiu o depoimento de moradores dos municípios mais populosos da Paraíba em torno de onde a passagem de um objeto pelo céu foi vista e ouvida no dia 20 de abril de 2015. Segundo Renato Bandeira, que demonstrou os detalhes dessa caçada em sua apresentação, eles conseguiram não apenas definir com bastante precisão a rota do meteoro, mas encontrar fragmentos nos municípios de Serra da Teixeira e Olho D’água. “Nossa metodologia já está sendo aplicada em outros casos parecidos em todo o Brasil, como o caso do Grande Meteoro do Oeste do Paraná, e serviu para divulgar entre a população o trabalho feito pelos astrônomos amadores. Graças a esses resultados, houve uma grande repercussão que levou ao aumento de câmeras de monitoramento, de uma para nove estações em toda a Paraíba”, revelou Bandeira.

As palavras do professor Irami Amazonas, da UFPE, resumiram a qualidade dos projetos: “os trabalhos foram feitos por astrônomos amadores, mas não deixam a desejar, não têm nada de amador”. “Precisamos resgatar o sentido original da palavra ‘amador’, não necessariamente daquele que não é profissional, mas daquele que ama o que faz”, declarou o fundador da Associação Astronômica de Pernambuco, Audemário Prazeres.

Ficou definida como sede do encontro do Eane 2018 a cidade de Bezerros/PE. Em 2017, o encontro está marcado para acontecer em João Pessoa/PB.

Alagoas no Eane
Alagoas foi representada pelo Centro de Estudos Astronômicos de Alagoas (Ceaal), o Clube de Astronomia de Maceió (Clam), o Centro de Ciências e Tecnologias da Educação (Cecite) e o Observatório Astronômico Genival Leite Lima (OAGLL). O estado teve oito trabalhos aprovados: três pôsteres e cinco apresentações orais.

Professor Adriano Aubert demonstrou como os astrônomos
amadores podem contribuir com a pesquisa científica

Os pôsteres foram sobre os resultados das pesquisas do Curso de Iniciação Científica em Astronomia (IniCiA), promovido a cada semestre pelo OAGLL. O estudante de geografia Genisson Panta, por exemplo, apresentou suas observações sobre as variações de brilho da estrela ER Carinae, que começou a estudar a partir desse curso, em 2014, quando ainda estava no 2º ano do Ensino Médio. “O IniCiA me mostrou o que é ciência, como ela opera e como eu poderia produzir trabalhos científicos”, resumiu.

A maior representação foi do Clam, que levou sete dos onze congressistas alagoanos. Criado em setembro de 2015, é a primeira vez que seus membros desenvolvem trabalhos acadêmicos para publicação. Formado por jovens entre 17 e 29 anos, o grupo levou temas diversos, mas todos relacionados à astronomia: ensino de astronomia, a criação de um instrumento para observação do Sol, comunicação científica e até a influência da microgravidade no corpo humano.

Bilhões e bilhões... de colaborações
Uma das fontes de inspiração desses “meninos” é o professor Adriano Aubert, diretor do OAGLL, que apoia o grupo: sua palestra, última a ser apresentada, foi sobre como astrônomos amadores podem contribuir com a ciência. “Os fenômenos celestes são muito numerosos, então é importante que haja mais pessoas observando. A American Association of Variable Star Observers [AAVSO, em português ‘Associação Americana de Observadores de Estrelas Variáveis’] já tem, em seu banco de dados, mais de 30 milhões de registros de astrônomos amadores do mundo inteiro”, comentou o professor.

Como demonstra Adriano, as contribuições dos aficionados por astronomia podem ser muito mais que um hobby, e ajudar até a garantir a proteção da espécie humana. “Há um grande interesse atualmente em relação aos objetos que passam próximos à Terra. “O Sonear [sigla para ‘Observatório Austral para Pesquisa de Asteroides Próximos à Terra’], em Minas Gerais, é formado por astrônomos amadores e já detectou onze asteroides que têm suas órbitas próximas à do planeta”, relatou o professor. “É muito importante que não apenas observemos, mas também publiquemos nossas observações”, completou.

O São João está chegando. Quem sabe, ao ouvir a tradicional cantiga do Gonzagão, mais nordestinos olhem para o céu, veja como está lindo, e nunca mais deixem de admirá-lo... e estudá-lo.

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